quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Cordelizando em São João – PE
Um contributo da cultura popular na transversalidade multidisciplinar na educação
É um instrumento educativo que objetiva popularizar o saber sistematizado utilizando-se de uma metodologia lúdica e com toda profundidade científica possível, uma forma chamativa pela agradabilidade do pesquisador/leitor. A literatura de cordel está associada à cultura dos mouros trazidos da Europa nas chamadas descobertas do novo mundo no século XVI, era uma forma de contar encantos mitológicos e fatos históricos através da arte da rima em versos acompanhados por instrumentais como a viola de cordas duplas para trovar, os pandeiros para ritmar o coco, as palmas e o pisoteado nas cantigas de rodas ou simplesmente o recital a voz alta para chamar a atenção dos demais do recinto geralmente analfabetos.
Antes do invento da televisão muitas histórias eram contadas nessa modalidade de literatura entre os de pouca leitura e semianalfabetos do nordeste brasileiro, estes criavam histórias ou adquiriam os folhetos que narravam contos de  príncipes e princesas encantadas, contos de assombração, de heróis vencedores, de valentões do povo, de romances proibidos, pragas de maldição, lutas do bem contra o mal, etc.

ESTRUTURA LITERÁRIA DO CORDEL

                A estrutura da literatura de cordel ou poesia matuta é muita rica em sua diversificação em formas de versos que se organizam em rimas seguidas ou alternadas, compondo um conjunto literário de mais de trinta tipos de harmonia literal com uma única característica que é a rima, pode falar em estilo a dupla, quadra, cinco versos, sextilha, sete versos ou sete pés, a oitava, a décima, etc. em vários ritmos musicais, as toadas e aboios dos vaqueiros, os coquistas ou cantador de embolada com seus pandeiros, os repentistas violeiros com variados repertórios de sextilhas, motes, moirão, martelos, galopes, quadrões, a gemedeira, entre outros. Vamos exemplificar alguns mais usados.
Exemplo de dupla ou dois versos:
Menina quando me beijas, fico todo arrepiado
Eu quero que tu me queira, quero ficar a teu lado

Exemplo de quadra, muito usada principalmente por iniciantes e nos improvisos das cantigas de roda, como o siriri por exemplo.

“O anel que tu me deste
Era fraco e se quebrou
O amor que tu me tinhas
Era pouco e se acabou”

Eu danço no meio da roda
Só para me divertir
O nome de quem paquero
Começa com a letra I

Vou entrando nessa dança
E tirando meu chinelo
Pra namorar a menina
Que tem cabelo amarelo

Obrigado meu amigo
Eu te acho muito belo
Mas, já sou comprometida
Por isso que não te quero

E o refrão típico em sete pés:

Ou siriri, ou meu bem, ou siriá
Tomaram meu amor
Me deixaram sem amar...
Eu agora arrumei outro
Quero ver você tomar
Eu tomo, eu tomo, eu tomo
Só se você não deixar.

A Sextilha é um tipo de composição a mais usada no cordel de nossos dias, os versos impares são soltos e os pares rimam entre si, ou rima primeira com  a segunda e a quarta com a quita e a terceira com  a sexta, típico de viola simples cearense.

Exemplo 1.
Sou professor de  História
E também sou cordelista
Conto as coisas acontecidas
Que deixaram alguma pista
Interpreto cada fato
Com o meu ponto de vista
Exemplo 2.
Os portugueses quando para cá vieram
Muita desgraça trouxeram
Pra quem nessa terra mora
Foram chegando e fazendo logo a guerra
Tomando conta da terra
Botando os índios pra fora
(Germano Maia, Limoeiro do Norte – CE)



A sete versos ou sete pés, do inicio do século passado, estilo de um cantador alagoano é uma elaboração que requer um pouco mais de requinte, apenas ficam soltas a primeira e terceira frase/linha a segunda e a quarta rimam com a sétima e a quinta e sexta rimam entre si, é como se o acabamento final fosse mais polido.
Exemplo:
Uma obra de arte
Depende de arquitetura
Uma coisa bem pensada
Ganha corpo e formosura
Eu capricho e não erro
Com o ferro amarro o ferro
Reforçando a estrutura

A décima  é a estrutura mais complexa do cordel, requer uma arrumação bem detalhada em dez versos/linhas totalmente entrelaçadas em rimas, são as trovas cantadas pelos violeiros, argumentos bem elaborados com rimas pausadas e complementares.

Exemplo:
Minha galinha pedrês
Do brejo da bananeira
Num dia de sexta-feira
Pôs vinte ovos de uma vez
No dia vinte do mês
Deitei eles com cuidado
Se não tivessem gorado
Me davam um bom paládio
Só tinha um ovo sadio
Nasceu um pinto pelado
*(autor desconhecido, provavelmente trovadores da região do brejo paraibano)


APLICAÇÃO DO CORDEL NA TRANSVERSALIDADE MULTIDISCIPLINAR NA EDUCAÇÃO

                A literatura de cordel é uma ferramenta atrativa e chamativa, pois discorre temas transversais de forma lúdica. Pode ser aplicada em linguagens e seus códigos principalmente para trabalhar a língua culta e o regionalismo, a necessidade da riqueza do amplo vocabulário na confecção da rima. As temáticas do cordel se baseiam em um dado que tem uma relevância real ou imaginária muito propicia para se trabalhar na área das humanas, ver a referência geográfica, a situação histórica e social, a conotação ideológica, a concepção filosófica e o que é de mais humano a emoção e o trato psicológico do autor, do leitor e do ouvidor das histórias narradas em cordel. É um importante resgate a cultura popular, inclusive obras abundantes que retratam a história e os anseios subjetivos do povo são copiadas de cordelistas analfabetos ou pouco letrados que vivem da rima do mato, as cantigas de coco, os aboios de vaqueiros, as trovas do violeiro, os versos do siriri e pastoril, em fim a riqueza que faz ser o que somos, nossa tradição cultural que nos identifica como raça, povo, gente diferenciada.